“... ser negro no Brasil
não se limita às características físicas. Trata-se, também, de uma escolha
política. Por isso, o é quem assim se define.” ( Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana )
A
desigualdade racial é algo muito presente em nossa sociedade brasileira e se
manifesta de diferentes formas. Entretanto, isso não está ligado apenas à cor
da pele, mas a uma história que faz parte da de muitos brasileiros. É a
trajetória de um povo que sofreu e lutou por seus direitos e que luta ate hoje
através do movimento negro, estudantil, etc.
Com a
colonização européia no Brasil, veio também a escravatura. Negros eram trazidos
da África em navios negreiros para trabalharem como escravos no Brasil. Viviam
em péssimas condições de vida, além de muita tortura e castigos físicos. Entretanto,
esse mesmo povo que sofreu, lutou pela sua sobrevivência. Eles formavam grupos
que eram bem organizados; fugiam e formavam quilombos, onde os integrantes
vivam em liberdade. Um dos mais famosos foi o Quilombo dos Palmares, comandado
pelo Zumbi dos Palmares. Nesses quilombos, eles tinham total liberdade
inclusive para as suas práticas religiosas.
A
escravidão no Brasil durou por um longo período, e somente em 1888 ela é
abolida. Entretanto, o Estado Republicano, com sua vocação elitista e
excludente, não integrou os negros à sociedade brasileira. Fruto da discriminação
racial, muitos negros ficavam sem moradia e sem meios para conseguiam empregos,
submetendo-se a subempregos ou estando em plena marginalização social. A grande
maioria passou a viver em péssimas condições, como os cortiços e favelas, além
de assegurar a sua sobrevivência em trabalhos informais e temporários. Inúmeros
textos literários, como as de Aluísio Azevedo e Lima Barreto, retrataram
fielmente a vida e a exclusão social dos negros e mestiços, ainda nos idos da
Primeira República.
Apesar
de passados 124 anos após a abolição da escravatura, ainda se propaga em nossa
sociedade brasileira o preconceito e a desigualdade racial, escondida sob a
capa da “democracia racial”. Estudos indicam, com dados sistemáticos, que os negros
possuem ainda salários inferiores aos que são brancos. Além disso, a taxa de
desempregados e de analfabetismo é muito maior entre a população negra, se
comparado com a branca. Quando o assunto é o homicídio, os índices maiores são
as de pessoas negras. Em relação às mulheres, através de um levantamento feito
pelo MDS em 2011, as 70,8% que se declaram pardas ou negras correspondem à
parcela extremamente pobre da população brasileira, enquanto as que se declaram
branca estão entre 50,5%. Estes dados, dentre tantos outros, apenas demonstram
o quanto em nossa sociedade brasileira ainda reflete a desigualdade racial.
Alguns
afirmam que não existe racismo no Brasil, porque somos uma mistura de raças. Se
for assim, uma série de perguntas é formulada, na busca de respostas diretas: O
que dizer diante de tais dados que atestam a forte disparidade social entre
brancos e negros? Por que a parcela majoritária da classe trabalhadora e de
subempregados que compõem o lumpenproletariado é de negros? Por que as oportunidades maiores de trabalho
são destinadas aos mais claros, em detrimento aos negros ou oriundos deste
segmento? Por que nas escolas e até mesmo nas universidades, os estudos sobre
Antropologia – baseada na questão étnico-racial – e em História – com a
historicidade do povo africano e sobre a cultura afro-brasileira – são ainda um
desafio, por sinal muito pouco explorado? Por que a cultura afro-brasileira é
pouco valorizada ou às vezes só é “admirada” no dia 13 de maio e 21 de
novembro? Por que o cabelo liso é mais “aceito” do que o “crespo”? Por que a
vocação de um negro de “sucesso”, em plena sociedade capitalista, se resumem ao
futebol e ao samba, sem se refletirem em outros campos ou áreas de conhecimento
ou de atividade social?
Tais
indagações nos levam a pensar em qual tipo de sociedade estamos e queremos construir.
Uma sociedade com oportunidades iguais para todos, ou a que continua a repetir
a historia de um passado injusto e opressor.
O censo
de 2010 demonstra que 15% dos brancos têm nível superior e os negros correspondem
a 4,7% apenas. Quando o ensino superior se refere à universidade publica, o
percentual em torno da população negra diminui mais ainda. O numero de negros e
pardos que ingressam no ensino superior na universidade publica é bem inferior
a do branco. A evasão escolar nas universidades públicas dos negros são maiores
ainda não apenas à conclusão dos cursos de graduação, mas nos de pós-graduação,
como o mestrado e doutorado – além, é claro, nos cursos de maior concorrência
candidato/vaga. Assim, quanto mais prestigio tiver o curso e a Universidade em
que ele é oferecido maior é a concorrência e menor o publico negro.
Uma das
medidas que podem ser feitas em curto prazo para essa reparação, e que haja
igualdade racial dentro da Universidade publica, seria o oferecimento de cotas
como política emergencial de reparação. A UERJ foi uma das pioneiras a
implantar o sistema de cotas raciais no Brasil. Neste sentido, vale ressaltar
que os estudos recentes da própria UERJ demonstram que os estudantes que
ingressaram através desse sistema estão se saindo muito bem em sua carreira
profissional e querem dar continuidade os estudos. Da mesma forma, as notas
chegam a ser iguais ou maiores a dos estudantes que ingressaram pelo vestibular
através da modalidade convencional. Isso é apenas um dos dados de que é
possível a promoção de uma maior igualdade racial, demonstrando que, com
vontade política, é possível promover uma plena igualdade racial, através da
oportunidade igual para todos para assim reparar essa divida histórica que o
Brasil tem com o negro. A médio e longo prazo, o Estado deve assumir para si o
investimento pleno em uma Educação em Tempo Integral, Universal, Gratuito,
Popular e de qualidade, a serviço do nosso povo e, em especial, democratizando
o seu acesso ao segmento negro de nossa sociedade, ainda excluído do pleno
acesso a oportunidades de excelência, seja educação, na cultura, no lazer e no
trabalho, dentre outros direitos sociais afins.
Em nossa
universidade, o debate sobre cotas ainda é tratado com muito conservadorismo. Entretanto,
podemos considerar os avanços sobre esse tema. Hoje, a UFRJ já está em seu
segundo ano de sistema de cotas sociais para alunos oriundos da rede pública. Nesse
período, foi possível aumentar o percentual de 20% a 30% dessas cotas. O debate
de cotas raciais ainda é um desafio a ser vencido; porém, caminhamos nesse
debate, em que não tenha apenas cotas raciais e o mero aumento da porcentagem
das cotas sociais, mas também uma política clara de assistência estudantil, onde
o cotista, além de ingressar no ensino superior, venha a ter também condições
de dar continuidades a seu curso.
São
esses e outros desafios na construção de uma universidade plenamente
democrática, popular, gratuita e de qualidade, à serviço do Brasil e do povo
brasileiro. Nada mais!